Educadores integram o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos.
Projeto adota o método Paulo Freire de ensino.
O Brasil tem mais de 14 milhões de analfabetos, quase 10% da população brasileira. O MOVA, Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos, criado pelo educador Paulo Freire, desenvolve um trabalho que ajuda a mudar essa realidade em todo o país.
Há 20 anos nasceu em São Paulo o Instituto Paulo Freire, que reuniu educadores e pensadores empenhados em levar pelo Brasil a luta pela educação e pelo desenvolvimento humano. Um grupo trabalha na pesquisa e na organização do acervo do instituto e do acervo pessoal de Paulo Freire para deixar o conhecimento ao alcance do público e da sociedade.
“A gente tem que trabalhar com 50 mil páginas de texto; 200 vídeos, que dão mais ou menos 300 horas de gravação; 200 cassetes; e três mil fotos”, diz Anderson Fernandes de Alencar, coordenador do Projeto Paulo Freire Memória e Presença.
O educador Paulo Freire ganhou notoriedade na década de 60, quando alfabetizou 30 cortadores de cana em apenas 45 dias, na cidade de Angicos, interior do Rio Grande do Norte. O feito abriu caminhos para o reconhecimento de uma nova maneira de ensinar a ler e a escrever.
“A educação de Paulo Freire é pautada na leitura da realidade. Ele vai problematizando a palavra. Essa palavra que vem nesse processo de alfabetização vem da realidade do educando. Isso passa a ter mais sentido para o educando ficar em sala de aula”, explica Francisca Rodrigues Pini, diretora pedagógica do Instituto Paulo Freire.
"Eu sempre digo que nós trouxemos pro mundo os filhos que puderam chegar porque houve outros que se atrapalharam no caminho e nunca chegaram. Mas trouxemos cinco pro mundo, três mulheres e dois homens, como resultado de lindos atos de amor. Nenhuma filha minha, nenhum filho meu e de Elza veio ao mundo por acaso", diz Paulo Freire em vídeo do acervo do educador.
“Ele tinha uma força interna muito grande de realmente se indignar contra as injustiças que ele via principalmente na sociedade brasileira”, diz Lutgardes Costa Freire, filho de Paulo Freire.
“Eu sempre digo que Paulo Freire deixou quase uma centena de obras, mas o que mais importa para nós é que ele deixou como legado a crença de que é possível mudar o mundo”, avalia Moacir Gadotti, diretor do Instituto Paulo Freire.
Em 1989 surgiu o MOVA, uma das maiores experiências práticas inspiradas nas ideias freireanas. “A educação acontecia nos locais onde eles moravam. Então, se utilizou de associações e espaços comunitários para que líderes comunitários pudessem ser formados e efetivar essa alfabetização”, explica Francisca.
Hoje, o Mova Brasil atua em dez estados. Desde 2003, o projeto já alfabetizou 172 mil brasileiros. Neste ano, serão formados 31 mil alunos em todo o país. O Nordeste serviu de berço para o pensamento de Paulo Freire e uma das milhares de salas de aula do movimento fica no município de Caucaia, na zona rural de Fortaleza, no Ceará.
Na comunidade de Matões a própria educadora construiu o espaço para dar aulas. “No início, nos três primeiros meses, a gente funcionava em uma sala da minha mãe. A minha irmã me emprestou o dinheiro, eu peguei o dinheiro que eu tinha, juntei e construí o espaço”, lembra a monitora Kátia Rodrigues.
Na sala que construiu Kátia muda e história da comunidade e da própria família. “Eu dou aula para a minha mãe, meu irmão, minha avó, meu tio e para minha tia”, diz.
“O meu pai não aceitou que eu estudasse. Quando eu queria estudar, ele dizia que para que filho de pobre saber ler e que caneta de filho de pobre era o cabo de enxada. Era o que mais a gente fazia, era trabalhar”, recorda Maria Gil dos Santos, avó de Kátia.
“O que eu mais aprendi eu posso dizer com certeza é valorizar o ser humano. Paulo Freire dizia que ‘não há saber menor ou saber maior, há saberes diferentes’. Às vezes porque você tem uma faculdade ou um curso técnico ou o ensino médio e conhece uma pessoa que não tem, você quer menosprezar essa pessoa. Mas todos eles aqui, independente do nível que eles chegaram aqui, independente do nível que eles estão, eles tem o valor, eles tem o saber”, diz Kátia.
Os alunos que à noite estão na sala de aula, durante o dia são trabalhadores rurais de uma horta comunitária ao redor da escola. Quanto maior o saber das palavras e dos números, maior o domínio do próprio negócio. “A gente fica mais desenrolado e mais apto para resolver as coisas”, diz o agricultor Francisco Duarte de Souza.
G1 Ceará
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